terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Capítulo 3

3 semanas passadas da viagem de Paulo José, Virgínia continuava sem saber o que (e quanto) esperar. A incerteza lhe consumia; sua mente hiperativa com certeza não era a melhor companhia nesses momentos em que só o que lhe restava era esperar.
De algum canto de sua mente, surgiram mamutes. Havia visto uma vez em um filme que mamutes possuem um só amor para toda a vida. Será que ele me ama? Será que vai ser para sempre? Sim, com mamutes a resposta é sempre afirmativa. Está na natureza deles; não saberiam agir de outra maneira. Virgínia ficou maravilhada com a possibilidade de amor eterno, e delirou que talvez um amor de mamute seria a grande solução para seus problemas.
Talvez a grande dificuldade estaria em achá-lo, na selva da vida moderna. Como diferenciá-lo de leões e cordeiros? Cordeiros não; nunca seria capaz de amar alguém que não lhe inspirasse admiração, que não fosse capaz de lhe proteger. Também não leões; não lhe atraía o ritual masculino de predadores, atrás somente de conquistar um sem número de presas indefesas.
Tanta farra no reino animal, tantos estilos diferentes de mamíferos, e o único que lhe interessava estava a milhas e milhas de distância. E, quem sabe, aumentando a cada dia mais essa distância...
Enquanto a voz rouca de Jon Bon Jovi gritava no seu ouvido: Baby you´re all that I need... (sim, aos sofredores todo consolo é permitido), Virgínia Maria se perguntava: qual o sentido de tudo isso?
E a resposta veio novamente, rouca e sexy: Keep the faith baby, keep the faith...

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Capítulo 2

Sentada na varanda do apartamento, cigarro meio apagado sobre o café frio, Virgínia voava longe...
Hoje não sou inteira.
Não sou nem metade...
Sou caco.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Capítulo 1

Virgínia estava cansada. Aquela semana havia lhe consumido emocionalmente. Seu noivo, Paulo José, havia finalmente arrumado um novo emprego. Mestre em Filosofia, dois livros lançados e com uma inteligência acima da média, encontrava-se desempregado havia dois anos. Acreditava que não deveria viver uma vida medíocre, por isso estava sempre à busca do emprego perfeito. Vivia de bicos, pela metade. Tinha dúvidas sobre os caminhos que deveria seguir. Além de sofrer golpes na auto-estima ao não ser reconhecido por sua genialidade, seu desemprego agravava seu estado emocional já que, por três vezes, teve que adiar o casamento com Virgína. O noivado já durava 10 anos, e por mais que aquele parecia ser o caminho certo a seguir, aparentemente a vida não lhes dava chance.
Cansado de esperar a vida resolver por si, e certo de que o futuro lhe reservava mais do que as certezas as quais já tinha se habituado, Paulo José resolveu tomar as rédeas de sua vida. Aceitou o emprego como professor da Universidade Lusíada, em Angola. A oferta era irrecusável: US$3,000 mensais, livres de despesas: acomodação, transporte e alimentação eram parte do pacote. Além disso, esse emprego lhe daria a vivência internacional que ele tanto almejava nos últimos tempos. O contrato era de um ano, no final do qual poderia decidir entre renová-lo ou retornar ao Brasil.
A universidade ficava na cidade de Lobito, em Benguela. Cidade de praia, considerada o local mais agradável do país. E também, cidade foco da Bramedes Maneiris, um inseto raríssimo e aparentemente inofensivo; já que hibernava durante a maior parte do ano. Porém, mortífero para um seleto grupo de pessoas que tinham alergia a sua picada. Virgínia, por ironia do destino, se encontrava dentre esses. Havia descoberto isso ainda pequena, quando ainda se encantava com o fato de seu coração ser do tamanho da palma da sua mão. Por muito tempo, essa estranha alergia lhe fora muito mais um motivo de curiosidade do que preocupação. A única recomendação do médico era que nunca, nunca, deveria ir à África. Já havia se acostumado com a idéia de uma vida sem safáris, e francamente recusava-se a estender suas preocupações para além disso.
Havia uma semana que Paulo José havia partido. Virgínia, naturalmente, ficou. A decisão é que deviam se separar, para que ele tivesse o tempo e espaço necessário para se achar, fazer-se por inteiro. Virgínia sofria, mas no seu íntimo tinha a consciência de que o sofrimento dele seria muito maior do que o seu. A ela caberia continuar sua vida; a ele, definir que vida queria ter. A ele caberiam a incerteza das decisões, o medo do arrependimento, a busca pelo amadurecimento e aprender a andar sozinho. A ela, cabia ser forte. Virgínia sabia que iria sobreviver, pois a vida lhe amadurecera bem antes. Porém, isso não foi suficiente para evitar o desespero. Sempre tivera acostumada a planejar e controlar sua vida, mas dessa vez sabia que nada podia fazer. Somente esperar. Martirizava-se por não saber quanto tempo o tempo iria durar. O produto final desse processo deveria ser duas pessoas diferentes, para que dois inteiros se fundissem em um. Mas não havia certezas.

Ao longo da semana, ela passou por uma intensa caminhada de auto-conhecimento. Colocou sua vida sob perspectiva, analisando e revendo cada canto de sua alma. Como diria Lord Henry, mundos tinham que sofrer, para que a mais insignificante flor pudesse desabrochar... Virgínia agonizou, morreu, mas renasceu. Preferia Fênix como segundo nome do que Maria, mas sua mãe havia sido mais religiosa do que criativa.

Cansada de tanta reflexão, decidiu apenas seguir em frente, aceitando o tempo, no momento, como resposta. Deixou-se adormecer ao cair da madrugada, ainda duvidando da cantora que em seu ouvido sussurrava: é a vida, é bonita e é bonita...